Olhar para uma imagem é mais do que apenas contemplá-la; é permitir-se ser atravessado por ela. Há algo na experiência do olhar que desperta emoções e memórias latentes, algo que toca nossos olhos, mas também a nossa pele, nosso sangue e a essência de quem somos. Mas o que é, afinal, aquilo que transforma uma cor em algo que nos invade e nos move?
Entre todas as cores, o vermelho se destaca como um canal privilegiado dessa intensidade. Ele transcende a ideia de pigmento, tornando-se uma experiência que parece pulsar e respirar diante de nós.
E não seria o incarnat a própria encarnação dessa força? Como sugere Georges Didi-Huberman, o incarnat é esse vermelho profundo e quase visceral, mais do que um tom: é carne transformada em pigmento, desejo convertido em matéria. Ele nos captura porque fala de algo que conhecemos sem saber: a fragilidade da nossa própria pele, o calor do sangue que corre sob ela e o mistério do que não podemos ver, mas sentimos pulsar.
O vermelho, em sua essência, é um convite à vertigem. Ele pode trazer à tona nossos anseios mais profundos e nossas memórias ancestrais. É claro que cada espectador que se depara com uma imagem marcada por essa cor carrega consigo uma experiência própria, um eco particular que reverbera naquele instante. Por isso, o encarnado nunca é o mesmo: ele muda conforme o olhar que o encontra. Para uns, pode ser o ápice do erotismo; para outros, um vestígio pungente da dor.
Esse jogo entre a superfície e o que ela promete revela algo essencial sobre o ato de ver. Quando olhamos uma fotografia ou uma pintura orquestrada pelo vermelho, o que de fato estamos vendo? Talvez não seja a cor, mas o que ela sugere. A cor rubra pode se tornar a ponte entre o visível e o invisível, entre a pele e o sangue, entre a matéria e o desejo. Ela é o incarnat, aquilo que nos devolve à carne, à vida e ao inexplicável.
Pintores e fotógrafos que exploram precisamente essa tensão trazem o vermelho como protagonista de um discurso visual que não se encerra na imagem, mas que se desdobra no espectador. Pinceladas ou pixels podem deixar lacunas que convidam a inúmeras interpretações. O vermelho é, afinal, uma promessa que nunca se cumpre por completo.
E nós, ao olharmos, somos parte desse jogo. Trazemos a essa cor intensa nossas próprias vivências, permitindo que ela nos afete de formas inesperadas. A experiência do olhar é também a experiência de ser visto: ao confrontar o incarnat, sentimos que ele nos atravessa, como se expusesse algo de nós mesmos que nem sabíamos estar ali.
E este artigo não é um fim, mas um começo. Uma provocação para você se deixar tocar pelo incarnat e descobrir o que ele tem a revelar sobre você. Olhar para uma imagem nunca foi um ato passivo; é sempre uma negociação, um desejo, um espanto. E, por vezes, um encontro.
Escrito por Angela Rosana, saiba mais sobre mim aqui.
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Publicação no Instagram em janeiro 2025
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